Tirando os crimes de Homicídio Qualificado que vemos nos jornais, os Crimes de Violência Sexual são os mais polêmicos na mídia, e que sofreram algumas mudanças significativas, no que diz respeito principalmente aos crimes de Estupro e Atentado Violento ao Pudor, em seu enquadramento e qualificação de penas.

Muito se houve falar em “Atentado Violento ao Pudor” e “Estupro”, mas poucos sabem suas definições e diferenças:

No Direito Penal brasileiro, atentado violento ao pudor, conhecido informalmente pela sigla AVP foi um tipo penal que vigorou entre 1940, data de criação do Código Penal Brasileiro, e agosto de 2009, quando a Lei 12.015/2009 o revogou.

Diferenciava-se do estupro por envolver ato sexual diverso da cópula (também denominada conjunção carnal ou sexo vaginal) ou ainda, quando a vítima do ato sexual forçado era do sexo masculino.

Havia diversas formas de atentado violento ao pudor, que compreendiam a prática de atos diversos da conjunção carnal, por exemplo, acariciar as partes íntimas de pessoa, após havê-la subjugado de alguma forma – pelo emprego de arma ou outra violência.

Neste caso, a violência é real (mediante intimidação capaz de anular a resistência normal da vítima); situação diferente da violência presumida – aquela em que a vítima era menor de 14 anos, ou deficiente física ou mental – onde a violência é presunção legal em virtude da menor ou nenhuma capacidade de se defender.

No Brasil, a definição legal para um homem que tenha sido vítima de qualquer tipo de abuso sexual ou uma mulher que tenha sido forçada a praticar qualquer modalidade sexual diversa do sexo vaginal (tais como sexo oral, anal etc.) era atentado violento ao pudor e não estupro, como é em diversos países do mundo.

Essa diferenciação se dava porquê, até a alteração promovida no Código Penal em 2009, esse dispunha que estupro consistia em “Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça” (artigo 213), ao passo que atentado violento ao pudor consistia em “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal” (art. 214).

A interpretação corrente e dominante era que “conjunção carnal” é somente a introdução do pênis do homem na vagina da mulher, não incluindo outras modalidades sexuais, as quais estavam incluídas no tipo de atentado violento ao pudor. Igualmente, por exclusão lógica, um homem – ainda que forçado a manter relações sexuais com outro – não poderia ser vítima de estupro, sendo, em tal caso, vítima do extinto crime de atentado violento ao pudor.

Por serem mais abrangentes, os termos violência ou abuso sexual ou violação estão sendo cada vez mais utilizados na hora de se referir tanto ao estupro quanto ao atentado violento ao pudor.

Em 7 de agosto de 2009, a Lei nº 12.015/09, que alterou a disciplina dos crimes sexuais no direito penal brasileiro, revogou o artigo 214 do Código Penal – que tipificava o crime de atentado violento ao pudor – e ampliou a abrangência do crime de estupro, de modo a abranger o antigo crime de AVP.

Hoje, o crime de estupro consiste em “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, portanto não mais se restringindo unicamente às mulheres.

Assim, com a reforma, a conduta que antes era tipificada como atentado violento ao pudor não deixou de ser crime; tão somente passou a ser tipificada como estupro em outro dispositivo legal.
Ocorreu também a equiparação das penas de atentado violento ao pudor e de estupro pela Lei nº 12.015/2009.

Foram unidas as figuras do estupro e do atentado violento ao pudor em um único tipo penal que recebeu o nome de ESTUPRO ATUAL art. 213 do Código Penal.

Vejamos:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§ 2º Se da conduta resulta morte:

Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.” (NR)

Nota: Assunto Polêmico a se pensar:

O Beijo e os Toques Lascivos

Eis uma questão que gera calorosas discussões na doutrina: A possibilidade ou não de o beijo e os toques lascivos serem considerado ato libidinoso diverso de conjunção carnal, ou seja, serem caracterizados como crime de estupro.

O professor Nelson Hungria, defendia que: “se o beijo for dado de modo lascivo ou com fim erótico, poderá ser enquadrado no conceito de ato libidinoso”. Essa era também a posição do professor Noronha, que leciona: “se o beijo na boca for dado por meio de violência ou ameaça, num impulso de luxúria ou volúpia, constitui ato de libidinagem”.

Conclusão
Da exposição feita acima, consideramos que a alteração feita no Código Penal pela Lei 12.015/2009 possui seus pontos positivos e negativos. Há vários outros pontos a serem abordados sobre esta alteração, mas que merecem um estudo maior e mais aprofundado.

Creio que acertou ao determinar que tanto o homem quanto a mulher possam ser vítimas do crime – antes só a mulher poderia ser vítima de estupro, mas, em contra partida, cometeu exagero ao considerar igualmente graves a prática de qualquer “outro ato libidinoso”.

Vimos que esse era o grande equívoco do revogado art. 214 do Código, que considerava atentado violento ao pudor, com pena mínima de 06 anos, a prática de quaisquer atos libidinosos diversos da conjunção carnal.

A nova lei, não corrigiu esse erro de abrangência. Persistiu no erro repetindo a mesma frase, punindo com 06 anos de reclusão, no mínimo, um beijo lascivo, por exemplo.

É provável que a intenção do legislador tenha sido a de equiparar ao estupro a relação sexual oral e anal, da qual o homem também pode ser vítima, mas teria sido preferível dar às coisas o nome que as coisas têm, em lugar de camuflá-las com uma linguagem imprecisa e demasiado abrangente, geradora de possíveis injustiças. Hipocrisia esta que pode atrapalhar os aplicadores do direito “Delegados, Advogados, Juízes”.

Na prática, não vislumbramos Magistrados aplicando 06 anos de reclusão, em regime inicial fechado, a um agente que tenha beijado uma mulher a força.

O que esperamos que aconteça no caso concreto é a descaracterização do crime de estupro quando o ato praticado pelo agente não possui uma gravidade equiparável àquele crime.

Também cabe aos doutrinadores, bem com aos operadores do direito fazer valer novas interpretações com o fulcro de formar entendimentos que façam com que a justiça seja respeitada e proteja realmente as vítimas dos crimes aqui analisados.

Espero que tenham gostado da matéria.

E lembrem-se não só a mulher, mas o homem também é vítima de estupro.

Muito importante lembrar também a proteção da Lei aos menores de idade, aumentando a pena do crime, a quem o pratica contra menor de 18 anos. A Lei protege também contra a violência sexual infantil.

Felipe Anjos é advogado, especialista nas áreas de Direito Empresarial e Contratual e é colunista do portal SP Jornal.

E-mail: felipe.anjos.adv@felipeanjos.com.br