Segundo denúncia realizada por reportagem da CBN, fiscais cobram propina para fazer vista grossa as propagandas vetadas pela Lei Cidade Limpa.
Durante uma simples volta pela cidade, ainda é comum o paulistano se deparar com outdoors, setas, faixas de divulgação e panfletos de lançamentos imobiliários disfarçados de jornais distribuídos pelos cruzamentos da capital.
Desde setembro de 2006, essa prática é proibida em São Paulo. No entanto, apesar da proibição e do risco de serem multadas no valor inicial de R$ 10 mil, empresas promotoras continuam divulgando a propaganda ilegal com a conivência de fiscais da prefeitura.
Na manhã do dia 31 de julho, a CBN publicou uma reportagem denunciando um esquema de corrupção nas Prefeituras Regionais. Chamada Máfia da Lei Cidade Limpa, fiscais da prefeitura fazem vista grossa as publicidades irregulares mediante a pagamento de propina. Dependendo do material utilizado para divulgação, o valor solicitado muda conforme uma tabela estabelecida.
Uma seta indicando um apartamento decorado ou a localização de um plantão de vendas, por exemplo, custa entre R$ 60 e R$ 100, por final de semana. De acordo com a região na cidade, as bandeiras podem custar R$ 50 e pelas faixas, que são necessárias duas pessoas para segurar, são cobrados até R$ 200 para os fiscais cruzarem os braços.
De acordo com a investigação realizada pelo repórter Pedro Durán, da CBN, o esquema funciona desde outras gestões, porém continua na ativa com a nova administração da Prefeitura de São Paulo.
A maior fonte de renda da Máfia é o dinheiro de grandes construtoras e concessionárias que querem anunciar novos empreendimentos imobiliários e venda de veículos. Entre os anunciantes e os corruptos estão as promotoras, que realizam a divulgação dos materiais nas ruas. Em alguns casos, funcionários públicos atuam como atravessadores no esquema de corrupção, se oferecendo para intermediar o pagamento da propina.
Disfarçado como um organizador de feirões de automóveis, Pedro ficou cara a cara com corruptos e corruptores que integram o esquema atuante em todas as cidades paulistas há anos.
Na Prefeitura Regional Penha, o repórter conversa com o funcionário de fiscalização que se identifica como Roberto e informa que quando a ação é muito grande, é necessário a aplicação de uma multa pequena para que não se levante suspeitas.
“Se encharcar muito uma região, você tem que tomar uma multa aqui outra ali, porque se alguém questionar a nível de staff: ‘não, a empresa foi autuada’ e encerra o assunto”, diz.
Já no extremo leste da capital, em Cidade Tiradentes, Alessandro Evaristo Santana é quem oferece o serviço. O agente de saúde foi transferido para a área de obras da Prefeitura Regional, mas atua mesmo em uma empresa promotora. Durante a conversa com Pedro, Alessandro liga para seu amigo Paulo, da Prefeitura Regional São Mateus, e combina de levar o esquema para lá.
Na Vila Prudente, Donizete, um agente vistor que a reportagem entrou em contato, disse que um coordenador estava dificultando. Ele passou o contato de Pedro para um ex-funcionário da Prefeitura Regional, Vander, que ofereceu até mesmo uma entrada irregular na Mooca.
Irmão de secretário do Governador Alckmin é citado
Na região da Lapa, o agente Edivaldo Souza Lima foi abordado por Pedro para auxiliá-lo no esquema. Ele levou a equipe de reportagem da CBN até Leandro Benko, número dois dentro da Prefeitura Regional e irmão de Laércio Benko, secretário de Turismo do governo de São Paulo, que foi indicado ao cargo graças a um acordo entre o PSDB e o PHS em troca do apoio à candidatura de Doria à prefeitura da cidade.
Com o conhecimento do Prefeito Regional Carlos Eduardo Batista sobre o esquema de corrupção, Leandro calcula um valor de R$ 7 mil para que a ação ilegal seja realizada e cobra a propina dentro do próprio gabinete.
“Eu tenho que abrir isso com o prefeito regional, que eu não posso fazer isso sozinho, aí tem o pessoal da fiscalização. São várias… Vamos dizer assim: são vários ‘pratos de comida’ que a gente tem que dividir, entendeu?”, diz.
Após a denúncia, Leandro Benko solicitou a exoneração do cargo, mas negou qualquer envolvimento com o esquema. Em nota, Leandro alega que recebeu o jornalista da CBN disfarçado para coletar mais informações sobre os atos ilegais cometidos no interior da esfera pública.
Impacto aos veículos de comunicação regional
Sancionada pelo então prefeito Gilberto Kassab (na época, PFL), a Lei 14.223, conhecida como Lei Cidade Limpa tem como objetivo evitar a poluição visual e tornar a aparência urbana do município mais harmônica e ordenada.
Para Wagner Farias, vice-presidente da Associação dos Jornais e Revistas de Bairro de São Paulo (AJORB), a prática irregular impacta, principalmente, os veículos de comunicação regional, que perdem investimento com publicidade, comprometendo sua missão de intermediar a voz da comunidade com os órgãos competentes.
“Com a publicidade ilegal, os moradores e comerciantes perdem a oportunidade de receber gratuitamente informações e bons negócios, além de expor, muitas vezes, as promotoras a situações desumanas. É obrigação de cada um denunciar esse tipo de ilegalidade, afinal sem subornáveis, não haverá corruptores.”, declara Wagner.
Qualquer cidadão pode denunciar propagandas irregulares, basta entrar em contato com a central de atendimento da prefeitura pelo telefone 156.
Posição da Prefeitura e demissões
Na ocasião, questionada pela reportagem da CBN sobre os fatos relatados, por meio de nota a Prefeitura de São Paulo informou que esperava receber todas as informações coletadas pela equipe de jornalismo para apurar e tomar medidas que punissem com vigor os envolvidos.
Ainda em nota, a Prefeitura alegou que a atual gestão não compactua com qualquer descumprimento da lei e nem será tolerante com nenhum ato de corrupção. O texto também afirmava que a fiscalização da Lei Cidade Limpa foi intensificada.
Logo que as informações foram recebidas, a então Controladora-Geral do Município de São Paulo, Laura Mendes de Barros, iniciou a investigação da “Máfia da Cidade Limpa”.
Nesta quinta-feira (17), duas semanas após a instauração das investigações, o prefeito João Doria (PSDB) demitiu Laura Mendes do cargo responsável pela apuração e correção das irregularidades administrativas.
Segundo nota emitida pela Prefeitura, a decisão se dá por razões administrativas e o Secretário Municipal de Justiça Anderson Pomini nega que a demissão tenha ocorrido por insatisfação com o trabalho realizado por Laura.
“Estamos fazendo mudanças administrativas e precisamos de uma Controladoria mais alinhada com as diretrizes do prefeito”, disse o secretário.
O novo indicado para assumir a Controladoria Geral do Município é Guilherme Rodrigues Monteiro Mendes, que ocupava o cargo de ouvidor-geral do município e atuou por 12 anos no Tribunal Regional Eleitoral.
Outra mudança na gestão Doria foi a exoneração dos prefeitos regionais da Penha, Jurandir Junqueira Junior, e da Vila Prudente, Jorge Farid Boulos Bou Cheb.
A decisão foi publicada nessa sexta-feira (18) no Diário Oficial do Município. Conforme nota, a Prefeitura informa que Farid e Junqueira solicitaram as exonerações dos cargos, no entanto, essa informação não consta na publicação do Diário Oficial.
Fernanda Maria Galdino assumirá a liderança da Prefeitura Regional da Penha e Guilherme Kopke Brito chefiará a Prefeitura Regional da Vila Prudente. Ambos atuavam como chefes de gabinetes em outras prefeituras regionais. Fernanda, em Cidade Tiradentes e Guilherme, em Sapopemba.
Como os prefeitos regionais anteriores, Fernanda e Guilherme passam a receber um salário de quase R$ 20 mil reais ao assumirem os cargos. Já Junqueira e Farid, a Prefeitura não soube informar quais os novos cargos que ambos passarão a ocupar.
Reportagem: Da redação. Foto: Divulgação.