Antes de analisar os aspectos positivos e negativos do pacote anunciado dia 12 de janeiro último pela equipe econômica do governo, cabe enfatizar que medidas dessa natureza, sempre com um quê de improviso, somente continuam sendo adotadas porque ainda não se realizaram as reformas tributária e administrativa. A conjugação de ambas representaria solução concreta para que o Estado fosse mais eficiente, menos oneroso e conquistasse o almejado equilíbrio fiscal.

A máquina administrativa deve ser mais enxuta, menos burocrática, ter mais produtividade e custeio menor. Quanto aos impostos, precisamos de isonomia de arrecadação entre os setores e simplificação do recolhimento. Há dois exemplos cabais sobre as distorções do sistema: o País tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, mas segue com desequilíbrio fiscal e presta serviços de baixa qualidade; e a indústria, embora represente hoje cerca de 11% do PIB nacional, recolhe um terço de todos os impostos.

Enquanto postergamos as reformas, desde a promulgação da Constituição de 1988, há 35 anos, vamos nos deparando com medidas imediatistas. O mais grave é que, cada vez que são anunciadas, exigem um processo de adaptação e ampliam a intrincada teia de regras e detalhes tributários, cuja gestão mensal já representa elevado custo de dinheiro, tempo e energia para as empresas.

Ressaltadas as questões estruturais, entendo terem sido positivos, dentre os atos da equipe econômica, os relativos à renegociação das dívidas com o fisco, no âmbito do novo Programa Litígio Zero.

Destaco os descontos de 40% a 50% para pessoas físicas, micro e pequenas empresas e de até 100% sobre o valor de juros e multas para as grandes, incluindo ampliação dos prazos de parcelamento, bem como a utilização de prejuízos fiscais e base de cálculo negativa para quitar entre 52% e 70% dos débitos. Tais negociações podem dar um fôlego aos devedores.

Em contrapartida, foi negativa a Medida Provisória 1.160/2023, incluída no pacote. O ato restabeleceu o voto de qualidade a favor do fisco, nos casos de empate nas votações do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), órgão de julgamento em segunda instância dos processos administrativos na Receita Federal.

A decisão viola a segurança jurídica, conforme explicam advogados especializados: a incidência tributária pressupõe certeza quanto aos fatos e adequada interpretação da legislação, à semelhança da aplicação da lei penal, de modo que, havendo dúvida razoável evidenciada pelo empate na votação, não poderia ser efetivada a cobrança, considerando o princípio de que ante a incerteza, a decisão deve ser pró-contribuinte. Além disso, não consta a possibilidade de questionamento judicial da decisão do CARF, fragilizando as empresas.

É fundamental, sim, restabelecer o equilíbrio fiscal, mas não à custa da oneração dos setores produtivos e consumidores, como se observa nas medidas pontuais adotadas de modo intermitente, que sempre apresentam distorções. Por isso, defendo reformas estruturais sólidas para o desenvolvimento nacional, no contexto de um projeto de Estado e não de governo. E de longo prazo.

*Rafael Cervone, engenheiro e empresário, é o presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP).

Foto: Divulgação.

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