Estou finalizando um curso de especialização em Docência no Ensino Superior. Sempre que um curso está a ponto de terminar começamos um processo de desapego, de saudades e de nos perguntar: e agora, como vai ser?

Acho a oportunidade em fazer um curso voltado 100% ao Ensino Superior super válido, afinal, dar aula exige conhecimentos técnicos da mesma maneira que lidar com uma cozinha. Um corte perfeito só será possível se houver o estudo e o domínio da técnica, e assim vejo o ensino na Gastronomia: só estará perto da perfeição quando os docentes da área dominarem e aperfeiçoarem as diversas técnicas existentes para o ensino.

No início do curso tive uma palestra com o Mestre e Doutor em Psicologia da Educação Marcos Tarciso Masetto, atualmente docente da PUC-SP e da Universidade Mackenzie, e uma de minhas colegas do time da Gastronomia levantou uma questão sobre o nosso tipo de ensino, o que, querendo ou não, não pode ser comparado a um ensino tradicional, como se dá em engenharia, medicina ou qualquer outra disciplina convencional.

Nosso grande problema se dá no afrontamento dos alunos perante o conhecimento do docente. A cozinha, por ser basicamente formada por um conhecimento empírico está rodeada de pessoas que se dizem mestres no simples ato de cozinhar. E ai está o grande desafio para nós: fazer com que o aluno compreenda a imensidão que é a Gastronomia, torná-lo capaz de desenvolver o pensamento crítico na tentativa de evitar que o aluno saia do curso sem absorver o conhecimento necessário. Quem cozinha quer cozinhar e quem estuda Gastronomia, quer o quê?

Acredito que muitos que levam a profissão com seriedade podem enxergá-la [ou ao menos ter um pequeno desejo de enxergá-la] como uma ciência. Eu dou à Gastronomia o mesmo valor que dou a uma Medicina, e principalmente a uma Engenharia, que é minha segunda formação. Sei que a Gastronomia não necessita de um cérebro tão bem domado como para essas demais disciplinas, afinal, estudar a vastidão humana de veias e tecidos ou as milhares expressões matemáticas existentes no universo das ciências exatas exige anos de preparação e dedicação, quando a Gastronomia, no fundo, exige apenas uma insistência física e prática.

Mas seja na Medicina, seja na Gastronomia, formar um bom profissional exige a MESMA dedicação. Se você quiser ser um bom chef terá que se dedicar. Como ouvi por muitos anos nos meus cursos de graduação: algumas horas “bunda” são fundamentais para desenvolver o cérebro pensante. Logo caro aluno de Gastronomia, ou colega docente, um aluno de Gastronomia precisa estudar para saber em que meio cultural, histórico e atual se localiza. Precisa compreender que um alimento jogado em um prato não possui o único intuito de alimentar, e sim de gerar história. É necessário que saiba que para se obter sucesso em um empreendimento é preciso conhecimento administrativo, o cálculo matemático, a psicologia que o fará ser um líder e não apenas um cozinheiro; é necessário muita psicologia para se lidar com pessoas e influenciá-las positivamente.

Logo, Gastronomia é ciência por tantos motivos, não só por razões químicas, que são óbvias, mas porque é uma disciplina que exige uma sinergia com tantas outras. Gastronomia vai muito além do estrelismo que vemos por ai.

Joyce Galvão,  é chef de cozinha e Engenheira de alimentos.  Professora, pesquisadora de gastronomia, palestrante e colunista do portal SP Jornal.