O artigo 196 da Constituição Federal é claro: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

No entanto, parece que com o passar dos anos, a Constituição é sistematicamente ignorada em diversos aspectos, sobretudo na Saúde. Foi constatada, há poucas semanas, uma queda de mais de 7% no número de médicos em hospitais estaduais da Zona Leste, sendo, é claro, os mais prejudicados, justamente aqueles localizados no extremo Leste da capital, como Hospital Geral de Guaianases.

“Fiquei praticamente um dia inteiro no corredor do hospital esperando atendimento e depois, me mandaram pra casa. Estava com dores fortes nas costas, mas a resposta é sempre a mesma. No fim você espera um atendimento que parece que nunca chega e quando chega, não dura nada nem 5 minutos”, disse Claudete Paschoal, que recentemente passou pelo Hospital de São Mateus.

A pergunta que fica no ar é: Em que momento fica claro que com menos médicos é possível prestar um atendimento melhor ao paulistano?

Descaso com o povo
O cenário chega a ser um clichê em qualquer reportagem. Pessoas esperam atendimento no corredor em razão da pouca quantidade de médicos que atendem no sistema. Eles fazem o que podem, mas, claro, o sofrimento da população é maior do que qualquer pressão que sintam no trabalho em função disso.

“Eu trabalho aqui no Hospital de Guaianases e raramente tenho tempo para ‘respirar’. A quantidade de gente que chega aqui pedindo socorro é grande e a gente ‘mata um leão por dia’ pra dar conta de atender a todos. O ideal seria o governo colocar mais médicos no sistema pra que todos pudessem ser atendidos com a qualidade que merecem. Não adianta ter conversa, tem que ter gente pra atender e diminuir as esperas nos corredores e salas de atendimento. É desumano com todos”, afirma um dos médicos que preferiu não se identificar.

Dados dos Tribunal de Contas
Segundo dados do TCE, em 2019, o Estado contava com 2.338 médicos no serviço público de saúde, hoje, o número caiu para 2.184. Uma queda de 154 profissionais. O Hospital da Vila Alpina, por exemplo, registrou a maior perda destes profissionais, de 819 para 638 médicos. O Hospital de Sapopemba também apresentou queda de 427 para 256 profissionais. O Hospital Geral de Guaianases, por sua vez, de 341 profissionais, hoje conta apenas com 234.

Em nota, a Secretaria de Saúde do Estado afirmou que os Hospitais de São Mateus e Itaim Paulista registraram aumento das contratações visando uma melhora nos atendimentos. O primeiro, passou de 535 para 661, e o segundo, de 216 para 395. 

Sobre os Hospitais de Vila Alpina e Sapopemba, o governo afirma que “Não há piora no atendimento prestado dentro dos hospitais e a pasta acompanha com frequência os atendimentos prestados conforme a demanda de cada região de São Paulo, uma vez que o quadro de funcionários destas unidades permanece completo”

Para 2025, porém, a pasta promete abrir concurso público para contratação de mais médicos e enfermeiros que deverão ocupar vagas no Hospital de Guaianases e também em outras unidades da capital com necessidade de reforço em suas equipes.

Fila de atendimento cresce
Apesar de o Governo acreditar que esteja tudo bem, a fila de espera por atendimento apenas cresce. No dia 2 de janeiro deste ano, após o primeiro ano da gestão Tarcisio de Freitas, o número de pessoas na fila aguardando atendimento nos hospitais públicos era de 2,2 milhões – conforme dados da Lei de Acesso à Informação (LAI). Em 2022, o total de pacientes aguardando atendimento era de 1,9 milhão. Ou seja, uma alta de 14,6%.

Só na capital, o número chegou a espantosos 52% em 2023, totalizando 445 mil pessoas à espera de um atendimento médico.

É preciso que o Governo do Estado, através da Secretaria Estadual da Saúde, verifique a situação real da demanda em hospitais mais carentes. Mesmo aqueles localizados próximo à área central também passam por superlotação. Sabe-se que não é apenas com médicos que tais problemas serão resolvidos, e claro, são necessários investimentos altos para suprir toda demanda do setor. 

O problema é que, se o Governador e os Secretários, bem como nossos deputados, nunca frequentarem uma unidade pública hospitalar para verem de perto a situação, se não saírem de seus gabinetes para encararem o problema, jamais conhecerão a frustração tanto de quem aguarda nos corredores por um atendimento – que é dever constitucional do Estado, bem como quem deseja atender a todos, mas não pode se multiplicar. 

Reportagem: Fernando Aires. Foto: Divulgação.

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